SOBRE MNEMOSINE, A DEUSA DA MEMÓRIA  E SOBRE A NOSSA MEMÓRIA

Mnemosine

Segundo a mitologia grega, Mnemosine  era deusa da memória e da lembrança.  Descendia de Urano — o céu —  e Gaia, a terra.  A titânia era filha de uma primeira geração divina, geração surgida no tempo original, onde ficaria o passado mais longínquo e que teria sido a geração de todos nós.  

A palavra mnemônico se relaciona à memória, à lembrança:  à Mnemosine. De acordo com o mito, foi a deusa quem descobriu o poder da memória, nomeando  vários objetos e criando conceitos para que os mortais conversassem sem brigar e pudessem entender.  Por isto é também considerada como aquela que tudo sabe e tudo lembra, sendo a criadora da linguagem. A importância da deusa da Memória era tamanha para os gregos que na obra Teogonia, de Hesíodo (sobre a origem dos deuses), a imortal é não só citada, como seu nome liga-se ao termo grego mimnéskein, que significa lembrar-se.

Mnemosine apaixonou-se por Zeus, o deus dos deuses, conseguindo atrair seus amor e atenção com seu exímio talento de contadora de histórias. O pai dos deuses foi seduzido pela deusa da memória durante nove dias consecutivos.  Meses depois, Mnemosine daria luz às nove musas, também conhecidas como filhas da memória ou musas protetoras das artes, ciências e letras. Seus nomes são: Calliope, Thalia, Melpomene, Euterpe, Polymnia, Clio, Terpsichore, Urania e Erato (vamos falar delas oportunamente, em Literatura é bom pra vista).

As filhas do casal de deuses também tinham por função presidir as diversas formas do pensamento: sabedoria, eloqüência, persuasão, história, matemática, astronomia, sendo invocadas pelos poetas. A própria Teogonia se inicia com uma invocação às nove musas.

Mas seria graças ao poder que lhe concedia  Mnemosine que a palavra quase cantada do poeta, ecoaria  por todo o universo, fincando-se na nossa memória.  Mãe e condutora das musas, a deusa da linguagem seria a responsável pela revelação e conhecimento do mundo, por intermédio da memória, sendo auxiliada pelo canto envolvente das filhas. Revelação no sentido de trazer, pela memória,  o tempo original (recordar e resgatar o tempo original) ao tempo da vida ordinária, a fim de que esta não se perca. Mas, ao contrário, revigore-se, fortificada  pela memória. É a memória que forja em nós exemplos a seguir, histórias a perpetuar, modelos a cultuar.

Antepassados, tradições nos tornaram o que somos. O papel da memória, contudo, é mais do que reviver o passado. É nos tornar dignos de nós mesmos, olhando o passado e avaliando o que merece ser revisto ou não. Mantido ou não.  Mnemosine nos impede de esquecer quem somos, de onde viemos, além de nos ajudar com sua arte de contar histórias a sabermos onde queremos e como queremos chegar.

O futuro não existe. É o presente misturado ao passado que nos torna capaz de construí-lo. O lugar mnemônico seria, então, o lugar da nossa imortalidade,  já que vive  em nossos filhos, netos; nas histórias que compartilhamos, nos hábitos que tivemos e na memória imortal que deixamos. É esta memória  que compartilhamos que se imortaliza na língua que falamos, nas culturas que dividimos, nos nossos sentimentos coletivos. É, então, esta nossa memória imortal que nos faz melhores  ao nos conceder o poder de não repetir o que não deve ser repetido e a engendrar outras memórias para o futuro. Que, repita-se, não existe. Mas está a nossa espera para existir.

Não é a memória o lugar da retenção do conhecimento, da aprendizagem? Não é a memória o lugar onde se inicia a elaboração do conhecimento científico? A memória liga o presente ao passado, a fim de que partamos para o futuro.

Deixe um comentário