CIAO, CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

Doutora em Letras pela Uerj, a professora Arilda Riani é articulista de Literatura é bom pra vista

 Um dos maiores nomes da literatura de língua portuguesa, o poeta Carlos Drummond de Andrade, natural de Itabira, Minas Gerais, nasceu no dia 31 de outubro de 1902, vindo a falecer no Rio de Janeiro em 17 de agosto de 1987, amargurado e triste com a morte prematura da única filha Maria Julieta, quinze dias antes.

         Em 1984, Carlos Drummond escreve uma carta à direção do “Jornal do Brasil”, um dos mais importantes da época, onde colaborou por 15 anos com crônicas e poesias nas páginas do Caderno B, para comunicar a decisão de se despedir da crônica, “sem se despedir do gosto de manejar a palavra escrita”. Nesta carta, faz um retrospecto da sua trajetória, dos 30 anos de jornalismo prestados ao Correio da Manhã e ao Jornal do Brasil” e dos acontecimentos que presenciara em 64 anos de vida dedicada às letras e à cultura do Brasil. O jornal publica essa carta-despedida no dia 29 de setembro de 1984, não sem antes negociar sua permanência, mesmo que em publicações reduzidas. Elegante, Drummond recusa a oferta, sob o pretexto de ceder o espaço aos mais jovens, para enfim cultivar o seu jardim, ainda que imaginário.  E com um CIAO ele se afasta, para tristeza dos seus de milhares de seguidores e admiradores.

                                               CIAO

“Há 64 anos, um adolescente fascinado por papel impresso notou que, no andar térreo do prédio onde morava, um placar exibia a cada manhã a primeira página de um jornal modestíssimo, porém jornal. Não teve dúvida. Entrou e ofereceu os seus serviços ao diretor, que era, sozinho, todo o pessoal da redação. O homem olhou-o, cético, e perguntou:
― Sobre o que pretende escrever? 
― Sobre tudo. Cinema, literatura, vida urbana, moral, coisas deste mundo e de qualquer outro possível. 

O diretor, ao perceber que alguém, mesmo inepto, se dispunha a fazer o jornal para ele, praticamente de graça, topou. Nasceu aí, na velha Belo Horizonte dos anos 20, um cronista que ainda hoje, com a graça de Deus e com ou sem assunto, comete as suas croniquices. 

Comete é tempo errado de verbo. Melhor dizer: cometia. Pois chegou o momento deste contumaz rabiscador de letras pendurar as chuteiras (que na prática jamais calçou) e dizer aos leitores um ciao-adeus sem melancolia, mas oportuno.

Creio que ele pode gabar-se de possuir um título não disputado por ninguém: o de mais velho cronista brasileiro. Assistiu, sentado e escrevendo, ao desfile de 11 presidentes da República, mais ou menos eleitos (sendo um bisado), sem contar as altas patentes militares que se atribuíram esse título. Viu de longe, mas de coração arfante, a Segunda Guerra Mundial, acompanhou a industrialização do Brasil, os movimentos populares frustrados mas renascidos, os ismos de vanguarda que ambicionavam reformular para sempre o conceito universal de poesia; anotou as catástrofes, a Lua visitada, as mulheres lutando a braço para serem entendidas pelos homens; as pequenas alegrias do cotidiano, abertas a qualquer um, que são certamente as melhores.

Viu tudo isso, ora sorrindo ora zangado, pois a zanga tem seu lugar mesmo nos temperamentos mais aguados. Procurou extrair de cada coisa não uma lição, mas um traço que comovesse ou distraísse o leitor, fazendo-o sorrir, se não do acontecimento, pelo menos do próprio cronista, que às vezes se torna cronista do seu umbigo, ironizando-se a si mesmo antes que outros o façam. 

Crônica tem essa vantagem: não obriga ao paletó-e-gravata do editorialista, forçado a definir uma posição correta diante dos grandes problemas; não exige de quem a faz o nervosismo saltitante do repórter, responsável pela apuração do fato na hora mesma em que ele acontece; dispensa a especialização suada em economia, finanças, política nacional e internacional, esporte, religião e o mais que imaginar se possa. Sei bem que existem o cronista político, o esportivo, o religioso, o econômico etc., mas a crônica de que estou falando é aquela que não precisa entender de nada ao falar de tudo. Não se exige do cronista geral a informação ou comentários precisos que cobramos dos outros. O que lhe pedimos é uma espécie de loucura mansa, que desenvolva determinado ponto de vista não ortodoxo e não trivial e desperte em nós a inclinação para o jogo da fantasia, o absurdo e a vadiação de espírito. Claro que ele deve ser um cara confiável, ainda na divagação. Não se compreende, ou não compreendo, cronista faccioso, que sirva a interesse pessoal ou de grupo, porque a crônica é território livre da imaginação, empenhada em circular entre os acontecimentos do dia, sem procurar influir neles. Fazer mais do que isso seria pretensão descabida de sua parte. Ele sabe que seu prazo de atuação é limitado: minutos no café da manhã ou à espera do coletivo. 

Com esse espírito, a tarefa do croniqueiro estreado no tempo de Epitácio Pessoa (algum de vocês já teria nascido nos anos a.C. de 1920? duvido) não foi penosa e valeu-lhe algumas doçuras. Uma delas ter aliviado a amargura de mãe que perdera a filha jovem. Em compensação alguns anônimos e inominados o desancaram, como a lhe dizerem: “É para você não ficar metido a besta, julgando que seus comentários passarão à História”. Ele sabe que não passarão. E daí? Melhor aceitar as louvações e esquecer as descalçadeiras. 

Foi o que esse outrora-rapaz fez ou tentou fazer em mais de seis décadas. Em certo período, consagrou mais tempo a tarefas burocráticas do que ao jornalismo, porém jamais deixou de ser homem de jornal, leitor implacável de jornais, interessado em seguir não apenas o desdobrar das notícias como as diferentes maneiras de apresentá-las ao público. Uma página bem diagramada causava-lhe prazer estético; a charge, a foto, a reportagem, a legenda bem feitas, o estilo particular de cada diário ou revista eram para ele (e são) motivos de alegria profissional. A duas grandes casas do jornalismo brasileiro ele se orgulha de ter pertencido ― o extinto Correio da Manhã, de valente memória, e o Jornal do Brasil, por seu conceito humanístico da função da Imprensa no mundo. Quinze anos de atividade no primeiro e mais 15, atuais, no segundo, alimentarão as melhores lembranças do velho jornalista. 

E é por admitir esta noção de velho, consciente e alegremente, que ele hoje se despede da crônica, sem se despedir do gosto de manejar a palavra escrita, sob outras modalidades, pois escrever é sua doença vital, já agora sem periodicidade e com suave preguiça. Ceda espaço aos mais novos e vá cultivar o seu jardim, pelo menos imaginário. 

Aos leitores, gratidão, essa palavra-tudo”.

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ESCRITORA REALIZA SONHO

Zezé Pedrosa

Maria José Pedroza, ou Zezé Pedrosa, como gosta de ser chamada, teve 90% de seu corpo queimado, ainda em sua infância (11 anos), no Incêndio do Gran Circus Norte-Americano, em Niterói, nos anos de 1961. Mas, a despeito de todas as dores que sofreu e das cicatrizes que carrega, ela não desistiu de seus projetos e sonhos: tornou-se professora e escritora. É esposa, mãe, avó e bisavó, tendo conseguido realizar o maior de seus sonhos: publicar sua biografia. O livro Vidas em Chamas apresenta, sem floreios, suas lembranças difíceis. E, agora, a autora lançará seu livro “Contos para não Esquecer”, sob o selo da Editora Proverbo. 

O trabalho da escritora vem sendo reconhecido e respeitado. Ela é considerada destaque na literatura regional por seus livros publicados e sua história de desafios e superação. Tanto que vereadores da cidade de São Gonçalo resolveram homenageá-la no dia 7 de outubro com uma Moção de Aplausos na Câmara de Vereadores da cidade. Literatura é bom pra vista reproduz um trecho do agradecimento de Zezé Pedrosa:

“Nasci em Niterói, moro em Tribobó, e São Gonçalo me presenteou. Agradeço a Câmara de Vereadores deste município pela homenagem. Eu, tentando representar, de alguma forma, a mulher preta e batalhadora que supera no cotidiano toda uma vida de dificuldades de uma mãe de família, pobre, me senti honrada com a homenagem. Os aplausos no plenário, literalmente falando, ainda soam em meus ouvidos. Muito obrigada”, declarou.

A autora vende seus livros através do Facebook: @escritorazezepedroza

OS POVOS DO WATU*

* Por Arilda Riani

Literatura é bom pra vista, neste belo artigo de autoria de nossa articulista Arilda Riani, faz uma merecida homenagem aos primeiros habitantes de nossa Terra Brasil (os indígena), ao meio ambiente que arde, aos rios de nossa Terra, tratando de um especial: o Watu, Rio Largo, depois Rio Doce. Hoje morto pelos dejetos das mineradoras Vale e Samarco, após os dois episódios gravíssimos de desprezo ambiental. A própria articulista descende deles, os botocudos. Doutora em Letras pela Uerj ela nos honra sempre com seus primorosos escritos.

Nessa capitania se acha terreno incomensurável ocupado pelo gentio mais bravo do Brasil, constantemente reputado por muitos rico de ouro, e muito fértil em todos os gêneros…

Houve um tempo, há milhares e milhares de séculos, que as florestas eram habitadas por Espíritos Bons, não havia mineradoras para contaminar a Natureza, o céu não era poluído por instrumentos voadores, e tudo de bom acontecia. Os rios corriam silenciosos e plácidos por planícies e vales nunca pisados pelo homem branco. Então, um rio laaaaaargo, laaaaaargo brotou de nascentes límpidas nas Gerais e correu caudaloso por vales verdejantes para abraçar o mar do Espírito Santo.

O Watu, hoje.

Às margens desse longo percurso surgiram várias populações, que se alimentavam dos baitas peixes e consumiam a sua água generosa. Esses povos se espalharam por aquelas matas e por séculos viveram em paz. Em época de festas, as mulheres enfeitavam os guerreiros com colares de contas brancas, as “lágrimas de Nossa Senhora”, untavam seus corpos com pasta de urucum e espalhavam ao redor dos olhos uma tinta preta de jenipapo maduro para deixá-los mais bonitos e prontos para guerrear, se necessário…

Aí, o Watu, o Rio Largo, teve nome alterado pelo invasor,

que teve ganância pela riqueza do solo.

Mas curso acidentado, cachoeiras, corredeiras e

povos da terra são impedimentos

para posse da região.

Foi então que se rompeu o equilíbrio entre o homem e a Natureza. Longe nos tempos, esses povos destemidos travam violentos confrontos com o invasor para defender o solo sagrado, as tradições, as aldeias e rechaçam os que querem escravizar suas mulheres, levar suas crianças…

Os indígenas Krenak vivem no Vale do Rio Doce

Tempo foi… Um dia, chega um rei na terra Brasil e declara “guerra justa” a esses os povos.

Naquele tempo

Não havia gado.

Nem cercas havia.

Povo da floresta

Não conhecia nem moeda

Nem arma de fogo conhecia.

O ruído das águas do Watu

Se misturava ao canto dos guerreiros,

Às vozes das mulheres,

ao alarido dos kruk nos seus folguedos.

Cujan se abasteciam tranquilos

Nos fartos formigueiros.

E nas guerras,

pelo pintado da kuparak

nos corpos dos guerreiros

dava força e coragem para enfrentar invasor,

que avançava mais e mais sobre terra.

Era preciso ocupar aquelas terras, acabar com aquele povo indômito, removê-lo, afastá-lo para regiões distantes a fim de desenvolver o progresso, incentivar a mineração, a agricultura, o comércio, construir ferrovias.

Aí, rei militariza região

com quartéis

para domar povo.

Craí insiste, avança.

Povo resiste,

mas é vencido pelo kraí.

Então, houve muita morte.

Povo foi pego no laço,

confinado,

escravizado nas aldeias.

O projeto de militarização fracassa, mas a dominação continua com a destruição de aldeias e plantações.

Aí, tempos depois,

kraí propõe política de atração e pacificação.

Mas o rei proíbe concessão de terras, que são invadidas em nome do progresso.

Povo teve território profanado pelo kraí,

Que levou malária,

tuberculose,

cachaça,

machado,

garimpo

guapok, o trem de fumaça.

Acometido pela malária, esse povo se atirava no Watu e muitos dos seus morreram como frutos caídos das árvores.

Vai…

 nas noites escuras e sem estrelas,

guerreiros são recolhidos por Nanitiong,

espíritos encantados dos mortos,

conduzidos às florestas para descansar

por noites e noites sem fim,

para nunca mais acordar.

Os poucos que sobreviveram foram aprisionados ou vendidos ou escravizados ou deixaram suas terras por muito e muito tempo. Resistiram o quanto puderam, mas vencidos pela força do kraí, partem para terras distantes para proteger sua gente, para se livrar do contato com o seu caçador.

Aí, povo partiu para longe,

Muito longe!

Levou arte de contar histórias

acocorado ao redor das fogueiras.

Levou costumes,

mitos, rituais, cânticos religiosos.

Levou botoques de madeira

que chefe usava na boca e nas orelhas

para ouvir espíritos do bem.

Levou cacaios,

cestas que mulheres traziam às costas

com uma faixa passada na testa

para conduzir crianças,

mantimentos,

tinta para pintar corpo,

barro para fazer panelas,

ervas para remédios.

Levou culinária de peixes, raízes e frutos!

Levou ensinamentos tirados às plantas e às ervas.

Um dia…

kruk recebem sinal de voltar.

Mulheres seguem na frente com cacaios

cheios de experiências do exílio,

e povo retorna para Kieme Breck,

a “Aldeia Bonita” no córrego do Eme,

na margem esquerda do Watu

E pouco a pouco reconstitui sua história.

Então, um desses meninos, criado em colônia indígena, já adulto e trabalhando em uma cidade próxima ao Kieme, deixa a vida de burocrata e corre para se juntar aos seus, e vê entre assustado e alegre que Maret cuidaram do seu povo e das plantações!

Os povos indígenas Krenak, remanescentes dos Botucudos, constituem hoje um grupo reduzido que ficou como protetores das Cavernas das Sete Salas no Vale do Rio Doces, onde praticam seus rituais, e sentinelas das águas sagradas do Watu, o Rio Doce, profanado e contaminado pela irresponsabilidade de empresas que não se intimidam diante da Mãe Natureza!

Não deixemos cair no esquecimento as tragédias que todos os dias atingem os povos indígenas nas constantes invasões das suas terras, as tragédias de Mariana e de Brumadinho, o fogaréu que consome o Pantanal e as nossas florestas.

ERÊ-Hê Watu!

ERÊ-Hê Floresta Amazônica! 

ERÊ-Hê Rio São Francisco!

ERÊ-Hê Rio Paraopeba!

ERÊ-Hê todas as fontes de vida que brotam na Terra!

ERÊ-Hê todos esses povos que amam e protegem a Mãe Natureza!

ERÊ-Hê todas as lideranças indígenas que perseveram na proteção das florestas, rios, fauna e flora da nossa Casa Azul, o planeta Terra.

ERÊ-Hê Ailton Krenak, escritor e ambientalista que na Assembleia Constituinte de 1988 pintou o rosto com tinta preta do jenipapo maduro, um costume ancestral, para defender com um discurso histórico os direitos dos povos indígenas!

Fotos: Internet (Agência Pública)

exposição virtual em museu do telefone

Estação telefônica

O Museu das Comunicações e Humanidades, abrigado na Oi Futuro, no Rio de Janeiro, está com exposição virtual em https://oifuturo.org.br/espacos/musehum sobre o passado e o presente da comunicação.

O primeiro telégrafo do Brasil

Com um catálogo de mais de 3.800 itens, a mostra virtual apresenta o primeiro modelo de telégrafo a chegar no Brasil no século XIX, telefonistas em suas estações de trabalho, primeira lista telefônica do Rio de Janeiro e muito mais.

O bisavó do orelhão e tataravô do celular

rádio batuta tem literatura também

A Rádio Batuta, rádio virtual do Instituto Moreira Salles (IMS) que fica no Rio de janeiro, completa uma década em 2020. Criada em agosto de 2010 pelo IMS para preservar a memória da música brasileira da metade do século XX, a Batuta hoje reúne um vasto acervo gratuito de MPB, mas também de jazz e música clássica.

A Rádio Batuta nos brinda com programação musical 24 horas por dia. Há também documentários como os de Pixinguinha, Jacob do Bandolim, Frank Sinatra, entre outros bambas. A Literatura não fica de fora com o programa Literatura em voz alta (https://radiobatuta.com.br/categoria-programa/literatura-em-voz-alta), com gravações de  poemas, contos e trechos de romances , muitas vezes feitos pelos próprios autores. Drummond, Carolina de Jesus, entre outros, estão por lá.

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IMAGEM: Internet